“If
someone does something we disapprove of, we regard him as bad if we
believe we can deter him from persisting in his conduct, but we
regard him as mad if we believe we cannot. In either case, the
crucial issue is our control of the other: the more we lose control
over him, and the more he assumes control over himself, the more, in
case of conflict, we are likely to consider him mad rather than just
bad”
“The
Nazis spoke of having a "Jewish problem." We now speak of
having a drug-abuse problem. Actually, "Jewish problem" was
the name the Germans gave to their persecution of the Jews;
"drug-abuse problem" is the name we give to the persecution
of people who use certain drugs.”
Thomas
Szasz
Uma das discussões que
ocorreram no início deste ano foi sobre a decisão do governo em
alguns lugares de tomar medidas mais duras em relação a moradores
de rua, especialmente em relação aos usuários de crack, através
de um “acolhimento” compulsório. Resolvi escrever alguma coisa
sobre este tema porque, lendo todo o debate que se criou, eu acabei
discordando dos dois lados, tanto dos defensores quanto os que são
contra a internação compulsória (curiosamente discordar de todos
os lados de um debate público tem sido uma rotina para mim). Aqui
vou apresentar rapidamente o que eu considero que deveria ser uma
posição condizente com uma visão liberal do problema.
A discussão é
dividida entre aqueles que acreditam que o Estado precisa tomar
atitudes mais radicais em relação a um problema radical que é a
dependência do crack, e o que justificaria a atitude coercitiva da
internação é que seria melhor para os dependentes no longo prazo.
O outro lado defende que a internação compulsória na verdade é
uma atitude estatal equivocada, e que o problema das drogas é um
problema social que merece outros tipos de políticas públicas, como
inclusão social, etc.
No primeiro ponto, eu
concordo com o segundo grupo: a internação compulsória é de fato
uma atitude equivocada. Equivocada por dois motivos: (1) os
resultados da política não irão satisfazer as intenções da
política, ou seja, internar a força dependentes de crack não
implica em uma redução do uso da droga. Isto pode ser constatado
historicamente de forma exaustiva, haja visto todas as tentativas
fracassadas de repressão às drogas. E (2) em uma sociedade
realmente livre, ninguém deve ser privado de sua liberdade, a não
ser que tenha privado outra pessoa de sua liberdade anteriormente (e
tenha passado por um julgamento com acusação e defesa); o que é
uma das crenças liberais mais importantes.
Sobre a formação das
cracolândias, é possível encontrar libertários com a velha
resposta pronta de que “se as ruas fossem privadas, etc”. Mas
essa é uma não-solução para o problema – as ruas não são
privadas e nem serão em um futuro próximo. Além disso, mesmo que
elas fossem privadas, ainda seriam espaços públicos, ou não seriam
ruas no sentido em questão. Respostas simples deste tipo não só
não apresentam uma solução libertária razoável, como acabam por
fazer outras pessoas pararem de escutar as soluções libertárias.
Ainda assim, mesmo a resposta pronta da privatização como forma de
solucionar qualquer problema comum não é válida aqui, afinal mesmo
dentro de uma propriedade privada ninguém tem o direito de internar
alguém a força. Esta é uma questão de soberania individual e não
de direitos de propriedade.
Entretanto, o crack, e
todas as outras drogas, não são um problema de “saúde pública”,
como muitos dos que são contra a internação compulsória afirmam.
O uso de drogas não é uma doença (que deveria ser combatida com
outras drogas legais), mas sim um hábito social. A “dependência”
como um problema de saúde não é algo objetivamente dado, mas como
se define e como socialmente se aceita a utilização de uma dada
substância. Mesmo os danos causados são questões subjetivas, que
dependem de quanto é consumido. Na quantidade certa, qualquer
substância causa danos irreversíveis, e é somente da
responsabilidade do indivíduo sobre o quê e quanto consumir. E não
existe nenhum critério objetivo capaz de elencar quais substâncias
devem e quais não devem ser usadas.
Para alguns, a questão
posta é “queremos viver em uma sociedade onde indivíduos utilizem
drogas que são capazes de transformar alguém, como faz o crack?”.
Esta é uma pergunta pertinente, mas que de forma alguma pode ser
respondida centralmente, apenas individualmente. Cada pessoa tem uma
própria visão sobre como todas as pessoas deveriam se portar, e se
tal opinião for uma unanimadade, não haveria nenhum problema a ser
posto inicialmente. Responder de forma central (ou seja, sugerindo
algo como “o que a sociedade quer”) qualquer questão sobre como
uma sociedade ideal deveria se comportar gera uma outra pergunta:
“queremos viver em uma sociedade onde alguns indivíduos possuam
algum controle sobre o comportamento de outros?”.
O problema de ambos os
lados do debate é enxergar o Estado como a solução para a questão
do crack – a discussão é somente sobre como o Estado deve abordar
o problema, duro como um pai ou compreensivo como uma mãe. A questão
que não é discutida é como o crack (ou qualquer outra droga) não
é algo ruim em si, mas um problema criado exatamente pelo Estado na
sua perseguição ao uso de certos tipos de substância. O consumo de
substâncias que causam danos ou dependência são questões
individuais, e não sociais. O único problema social é exatamente a
caça às bruxas que é feita atrás de pessoas que consomem,
produzem ou comercializam determinadas substâncias. Só existe uma
conduta possível para o governo solucionar a questão das drogas,
que é parar de tratá-las como um problema em si.